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Uichiquibeijmaijpuunapuuhuc!

por Noga Lubicz Sklar *
publicado em 12/03/2008.

Este episódio Circe do Ulysses é tão complexo que dá pra ver nele como Joyce se enrolou. É muito interessante: a dimensão do impacto criativo do artista retém o seu frescor nas loucuras do texto.

Tenho aqui em casa, vocês sabem, quatro versões principais do livro (fora capítulos esparsos na web e milhares de anotações): duas em inglês (uma impressa e uma em pdf) e duas em português, sendo a do Houaiss impressa e em pdf, o que facilita as idas e vindas, a busca de palavras através do livro, ocorrências repetidas e, agora em Circe, discrepâncias entre elas, ou vocês pensavam que eu guardava tudo isso na cuca? Ho ho ho, gente, assim nem Joyce. O curioso é que Houaiss seguiu a versão que tenho impressa e Bernardina seguiu a versão que tenho em pdf, o que dá uma visão quase completa da coisa.

Joyce, a gente nota, acha às vezes que exagerou na radicalidade. E volta atrás. São palavras inventadas, frases, falas inteiras cortadas ou acrescentadas, porque embora a minha mente lógica queira acreditar que a mais complicada veio primeiro não dá pra garantir nada, já que em Joyce, todo mundo sabe, a complexidade tendeu a se agravar até desembocar no quase incompreensível Finnegans Wake. Há momentos no Ulysses que são a prévia perfeita disso - é Burgess quem aponta -, como num dos paragráfos finais de Nausicaa que resume em meia dúzia de frases todo o pensamento do personagem até ali. Ou ainda no inglês recém-parido do Gado misturando sons de não sei onde pra resultar num idioma pra não sei quem muito joyciano mesmo, fecha essa matrafalaca. Ops. Falamatraca.

Circe é composto na forma de um texto teatral, e é na boca de cena que tudo acontece ao vivo e a muitas cores, ficção alucinante misturada ao fato tudo ao mesmo tempo agora. São centenas de personagens todos com fala, da maçaneta da porta ao farfalhar do bosque ao fantasma alegórico da mãe, desdentada e embolorada com hálito de cinzas um lado do rosto caíndo de podre e buracosnolugardeolhos, mascacadáver, derrubada pela espada de Sigfried: Nothung! As referências são múltiplas, de dentro e de fora do Ulysses, haja memória e ela às vezes falha, ainda mais se obscurecida por álcool. Delirium. Tremens. Tremei. E é nesse forró safado que o malandro escorrega, troca de par, tropeça, levanta poeira, sacode a bengala, dá a volta por cima e ainda pede bis. Anarriê.

Switchback, por exemplo, em português caminho em ziguezague, aparece como wiswitchback. Thursdaymornum, quase manhãdequinta, aparece também como Thursdaymomun, momentodequinta? Iago a gogô. Ou a risada de Bella que muda de lugar de uma versão pra outra, o que faz uma diferença enorme: num caso ela ri de Marion mas, no outro, de Boylan. Ou como faz mais sentido o canicorpo de Kynch matar o cadelacorpo dela sua mãe do que Kynch matar o canicorpo cadelacorpo dela mãe, principalmente ao levar-se em conta que o sublimado não-corrosivo dele se corroeu e sumiu, mas vamos combinar, pelo menos algo importante Joyce deixou no ar até segunda ordem, uma pergunta sem resposta, ô mãe, qual é mesmo a palavra? Se é que ela agora sabe, depois de morta, se é que a palavra existe: a que todos os homens conhecem. Então? Qual é?

O que ainda resta pra ser explicado é como foi que um romance desses, tão desbragado - e cá entre nós, tão localizado -, virou assunto favorito de teses acadêmicas no mundo todo (tem até no Japão) e modelo de complexidade, caindo nas graças (ou garras) da intelectualidade erudita, gente séria que não é como a gente seria mesmo que entendesse tudo, e me acreditem: no fundo no fundo a gente até que entende. Mas vêm os grandes mestres e atacam o corpo vivo do texto como se carniça fosse, com uma voracidade de urubu, acorrentando a leveza irônica da crônica com as asas de chumbo da teoria especulativa. Tô fora. Mas se for pra falar de Mestre Joyce, do fundo do coração, tô sempre dentro, isto é, até que me expulsem.

Sobre o Autor

Noga Lubicz Sklar: Noga Lubicz Sklar é escritora. Graduou-se como arquiteta e foi designer de jóias, móveis e objetos; desde 2004 se dedica exclusivamente à literatura. Hierosgamos - Diário de uma Sedução, lançado na FLIP 2007 pela Giz Editorial, é seu segundo livro publicado e seu primeiro romance. Tem vários artigos publicados nas áreas de culinária e comportamento. Atualmente Noga se dedica à crônica do cotidiano escrevendo diariamente em seu blog.

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