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Literatura e Cinema

por André Carlos Salzano Masini *
publicado em 31/07/2004.

No último dia 20, Jayme Monjardim, diretor do filme "Olga", declarou em entrevista ao Jornal da Globo:

"O filme é a história das emoções que os livros não contam. Os livros contam o quê? Contam os atos, contam o que aconteceu, mas não contam a emoção que essas pessoas viveram".

Triste a sina de nossa cultura, quando alguém que não sabe o que é um livro chega a ser diretor de cinema.

Quais, afinal, são esses livros que contam "fatos" e não "emoções"?! Imagino que os únicos volumes que Jayme Monjardim jamais abriu são a lista telefônica e o manual de sua TV.

Literatura: existirá algum gênero artístico que mostre emoções de forma mais intensa?

Em qual obra de arte poderíamos encontrar um ódio vingativo como o de José de Arimatéia, que salta das páginas de Chapadão do Bugre, de Mário Palmério? Ou aversão como a que Mestre Amaro tinha contra seu Lula, em Fogo Morto, de José Lins do Rego? Ou deslumbramento inocente como o de Amélia, ou desejo bestial e hipocrisia como a de Padre Amaro, saídos da pena de Eça de Queirós? E que não dizer da fúria assassina do irmão mais velho dos Karamazov? ou da mescla de amor, dúvidas e determinação de Robert Jordan, o protagonista de Por quem os sinos dobram, de Hemingway?

E nem precisaríamos ir tão longe. O próprio livro "Olga", no qual se baseia o filme, vai muito além de "fatos". Seus personagens estão longe de precisar de qualquer "diretor de cinema" para "revelar suas emoções" através de um filme.

"Olga", como todos livros de Fernando Morais, traz sim fatos e sim examina a história, mas vai muito além disso. Mesmo sem ser uma obra prima da Grande Literatura, oferece emoções abundantes e verdadeiras. Eu mesmo chorei diversas vezes ao ler o livro e recordo vividamente de algumas passagens: o despertar do amor entre Olga e Luís Carlos Prestes, dois idealistas com almas cheias de determinação, em sua viagem ao Brasil; o nascimento da filha Anita, nos porões da Gestapo; ou até mesmo o inesquecível relato factual da rendição de Agildo Barata, líder do levante da Praia Vermelha:

Barata rendido. As tropas legalistas se aproximam. Alguém pergunta:

-- Quem é o filho da puta do Barata?

Barata responde:

-- O Barata sou eu, o filho da puta é tu!

São fatos, mas as emoções também estão lá.
Porém Jayme Monjardim, diretor de cinema, afirma que "livros não contam emoções"...
São os tempos em que vivemos.

Ao se fazer uma comparação séria entre Cinema e Literatura, verifica-se que a única coisa que o cinema e a TV têm que a literatura não tem são "sensações" visuais e auditivas diretas: música, paisagens, ritmo de imagens, etc... Mas imagens e sons não são uma necessidade para que emoções humanas possam ser transmitidas e sentidas; pois as emoções não estão nos olhos dos homens nem nos ouvidos; mas em suas mentes e corações.

Em última instância, a emoção que o cinema consegue transmitir brota exatamente da mesma fonte que a emoção dos livros: a história. Aliás, qualquer distinção entre um script, o texto de uma peça teatral, ou um romance, jamais poderia ser feita com base no conteúdo emocional. Suas diferenças se restringem à forma e a aspectos exteriores.

Mas então por que Monjardim faria tal comentário?

O problema é que os recursos sensoriais da TV e do cinema podem usados (pelos cineastas que não são verdadeiros artistas) como meio vulgar de criar "emoções fáceis", que entram acabadas na cabeça de quem assiste, e visam atingir até os espíritos mais embrutecidos; as mentes mais entupidas de novelas e slogans publicitários; os corpos mais entediados, largados em poltronas, comendo pipocas...

Deviam ser essas "emoções fáceis" que Monjardim tinha em mente quando disse que "os livros não contam emoções".

O que os livros -- e a verdadeira arte, qualquer que ela seja, através de qualquer dos cinco sentidos humanos -- oferecem ao espectador/leitor é a realizadora experiência de recriar as emoções em suas próprias mentes e corações. Livros, é necessário algum esforço para abri-los, digeri-los, pensá-los. Mas para aqueles que se dão a esse trabalho, a recompensa são emoções em estado muito mais puro, sutil, profundo, verdadeiro e realizador... infinitamente mais rico que tudo que a cultura de massa, de consumo fácil e pronto, jamais poderá oferecer.

O consumo do pronto, fácil e acabado, a negação da possibilidade de recriação, é a causa da boçalização do ser humano no mundo globalizado.

Por ser diferente disso, e fazer as pessoas pensarem, a leitura é tão importante. E por isso a declaração de Monjardim é tão lamentável.

Sobre o Autor

André Carlos Salzano Masini: André C S Masini nasceu em São Paulo, em 1960. Aos 17 anos escreveu sua primeira história de ficção científica, "Os montes além do deserto", que existe até hoje em manuscrito. Cursou Geologia na USP, e formou-se em 1983.

Hoje tem dois livros publicados: a ficção científica "Humanos" e o livro de traduções e estudos “Pequena Coletânea de Poesias de Língua Inglesa”, além disso tem uma coluna semanal no Jornal "O Paraná", e é diretor de um centro cultural virtual, a www.casadacultura.org, que divulga seus trabalhos e tem milhares de assinantes em todo o Brasil.

contato: andre@casadacultura.org

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