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O bem que animais e pássaros nos fazem

por Deonísio da Silva *
publicado em 12/06/2008.

A imprensa não deu uma única linha sobre a morte de Salomé. Com o mesmo nome, ela será eterna como personagem do "Goethe e Barrabás". Acontece que Salomé não suportou os calores do Rio e morreu.

Fiquei desolado com a morte de minha chinchila, tão querida, amorosa, doce, delicada, que jamais emitiu qualquer ruído que não fosse a canção dos chinchilas.

Certa noite acordei com sua cantoria. Semelhando um esquilo, é um animalzinho que poderia berrar, grunhir, latir, miar, mas cantar? Cantar é ofício de pássaros e da Gal Costa, por exemplo, que cantou o Hino Nacional no Mineirão, antes de o Brasil empatar de zero a zero com a Argentina.

Falando nisso, acho que deveriam parar de cantar o Hino Nacional antes de comícios e espetáculos como jogos de futebol, por três motivos.

O primeiro: dá um azar danado! Fafá de Belém tornou-se coveira de uma porção de gente com essa coisa de cantar o Hino Nacional no comício das "diretas já", lembram? De uma vez só, morreram Severo Gomes e esposa, Ulysses Guimarães e esposa, e o piloto do helicóptero. Aliás, Ulysses Guimarães desapareceu. E antes Fafá de Belém já estivera associada à morte de Tancredo Neves.

O segundo motivo é a vergonha nacional. Poucos sabem cantar direito o Hino Nacional. Não me refiro à música. O brasileiro é muito bom em música, em ritmo, em harmonia. E, claro, em alegoria, dança etc. Eu me refiro à letra, que a maioria canta. Letra de hino é um problema sério! A letra do Hino de São Carlos tem erros de português, por exemplo. A do Hino Nacional não tem erro algum, mas todos acrescentam muitos erros quando o cantam.

O terceiro motivo é que nossos jogadores não sabem cantar o Hino Nacional. Parece que desaprenderam a jogar futebol também, mas este é outro problema, talvez pior ainda, pois o futebol, assim como o samba, compõe um dos fortes elementos da identidade nacional.

Mas que faz a calopsita nesta crônica? Ela se chama Lalá. A chinchila, chamada Salomé na vida real, chamou-se Lalá no "Goethe e Barrabás". Estou sendo claro? Lalá, no meu romance, é uma chinchila. Lalá, agora, na vida real, é minha calopsita.

Eu a comprei no "Bird", uma loja de pássaros aqui da Barra da Tijuca, no Rio. Quem vem à Barra da Tijuca, pode pensar que chegou aos EUA, mais especificamente a Miami, que todos pronunciam "Maiami"e deveriam pronunciar Miami, pois é nome indígena. E os índios pronunciavam Miami.

Pois bem, na Barra da Tijuca a língua oficial parece o inglês. Barra Palace, Barra Life, Golden Green, os nomes são todos em inglês.

Lalá me acompanha pela casa aonde quer que eu vá. E gosta de dormir ao lado de minha cama. Faz de um sapato, sandália ou chinelo o seu poleiro. Enquanto eu não apagar a luz, ela canta, sibila, conversa, pede um chamego. Pássaros, como sabem os que os têm, adoram carinhos na cabeça, adoram que cocemos as penas do pescoço.

Enquanto escrevo estas linhas, Lalá passeia pelo apartamento. Estou ouvindo músicas clássicas, são as que dominam a dieta cultural da Rádio Mec. Lalá aprendeu a gostar da precisão das notas de Beethoven, da suavidade de Mozart e até das violentas explosões de Berlioz.

Quando abro os jornais, ela me olha espantada e fica em silêncio. Deve estranhar que eu leia as mesmas coisas todos os dias. Lalá nem sequer notou que eu não leio mais notícias de políticos. Apareceu político, eu pulo. E assim há bem menos coisas para ler no jornal.

Houve um tempo em que a aristocracia nos fazia crer que condes, barões, viscondes etc eram indispensáveis, sem eles não se podia viver. Depois descobriram que viveríamos muito bem sem eles. Muito bem, não sei. Mas eles não eram indispensáveis. Com senadores, ministros da pesca, da caça, das frutas, do milho, do soja etc pode acontecer o mesmo daqui a pouco.

Mas se os políticos não nos fazem falta nenhuma, precisamos admitir o óbvio: sem os pássaros, o mundo ficaria muito mais triste do que já é.

Lalá enche este apartamento com sua alegria sem motivo. Canta porque é este o seu ofício. Mas o que mais me comove nela é que adora a minha companhia e quer estar sempre perto de mim.

Quem não se comove com um ser com tal perfil? Você já foi prejudicado por um animal de estimaçao? Mas por seres humanos, ainda que colegas e até amigos, já. Pensemos nessas lições que os bichos nos dão.(xx)

Sobre o Autor

Deonísio da Silva: Escritor e professor da Universidade Estácio de Sá, doutor em Letras pela USP e autor dos romances: A Cidade dos Padres, Orelhas de Aluguel, A Mulher Silenciosa e Avante, Soldado: Para Trás, entre outros livros. Este último foi contemplado com o Prêmio Internacional Casa de las Américas, traduzido em outros países e também publicado no Brasil

Conheça seu mais recente romance: GOETHE E BARRRABÁS

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