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Existências únicas

por Noga Lubicz Sklar *
publicado em 07/05/2008.

Quem nasce escritor não desiste nunca: uma maldição travestida de bênção, doa a quem doer que dói mais em nós. Não vou perder meu tempo em repetir, nem enfatizar: vai lá que tá tudo lá. O que eu já senti, o que eu já escrevi, e sobre o que eu já refleti está lá, em termos muito claros: Existências duplas, O Globo, Prosa & Verso, 3 de maio de 2008 página quatro, não disponível online para não-assinantes do Globo. José Castello não precisa de mim para o advogar e, além do mais, ando ocupada demais pra isso, desenredando minhas próprias dúvidas em tempo integral.

Já faz um tempo que pedi ao Castello — pedi não, implorei —, que lesse meu "romance de estréia" e me escrevesse em particular uma daquelas cartas terríveis que ele escrevia, demolindo intenções e desvendando nós de tramas, ou dramas, sempre com a atenção de reconstruir dos escombros resultantes um novo e fresco escritor, mas o Castello, tsk, tsk, não teve tempo pra mim (nem interesse, é preciso falar a verdade). Para mim, no entanto, nunca falta tempo nem interesse para/em ler o que ele escreve, mesmo porque o Castello merece.

Nada pessoal. Pois mais tempo se passou e se amadureci não sei, mas nasceu assim mesmo outro livro, outro gênero literário noutra aventura pessoal e intransferível, traduzida em linguagem pessoal e intransferível e aí é que está, Castello: embora seja dupla a existência do escritor, como você sensivelmente aponta, a verdade, a verdade mesmo sem papas na língua, é que a cada escritor — ou leitor — cabe uma existência única, indivisível, irreproduzível por mais que todos. Se é que vocês me entendem.

Pois mais tempo se passou e hoje em dia trabalho, sigo trabalhando amparada por outra generosa crítica dessas bem honerosa, desinteressada e que, como eu esperava, tem me ajudado muito, uma espécie, assim, de anestesia incompleta — ministrada com pena descartável por profissional gabaritado e bem reconhecido que se dispôs ao vago sacrifício — aliviando a aflição de parir um livro e que mesmo doendo muito, dói menos que a incerteza do mercado. Ou a indiferença. Tem valido a pena e sim, leitores, sei muito bem que onerosa é sem agá, mas pensem um pouco pra descobrir porque foi que cometi este erro induzido: há honra nele, há dubiedade na trama e unicidade na entrega, cumplicidade adivinhada e temida entre um autor e seu crítico.

O resultado não tarda. E aí, quem sabe, até mesmo o Castello se animará comigo. Como me animo com ele em todo sábado de manhã, mesmo que o caderno literário inteiro se resuma a um levemente incômodo espinho mal encravado.

Isto dito me calo, de volta ao embate único e solitário da minha tela.

Sobre o Autor

Noga Lubicz Sklar: Noga Lubicz Sklar é escritora. Graduou-se como arquiteta e foi designer de jóias, móveis e objetos; desde 2004 se dedica exclusivamente à literatura. Hierosgamos - Diário de uma Sedução, lançado na FLIP 2007 pela Giz Editorial, é seu segundo livro publicado e seu primeiro romance. Tem vários artigos publicados nas áreas de culinária e comportamento. Atualmente Noga se dedica à crônica do cotidiano escrevendo diariamente em seu blog.

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