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Mais um ano novo

por Pablo Morenno *
publicado em 29/12/2006.

Começará o 2007 e procuraremos ser mais otimistas. Ser otimista não tem efeito colateral. Abusemos. Escolheremos a melhor roupa, nos reuniremos com a família, receberemos o ano novo com champanha, lentilha, porco – que fuça para frente - e uvas bem maduras. Bebida para trazer as alegrias, lentilha para a prosperidade, porco para abrir caminho entre coisas ruins, e uvas – um grão por ano, para garantir o sucesso. Brindemos à esperança, à paz, à benevolência, à vida.

Pois bem. Sejamos otimistas, mas não ingênuos. O mundo não mudará por nossos bons desejos, porque estouramos uma garrafa de sidra e comemos carne suína, lentilhas, e doze grãos de uva. O mundo nunca se detém em suas tragédias que encolhem o coração e engasgam os sentidos.

Há coisas cotidianas, pequenas, que estragam um dia: o carro estraga, derramamos café na camisa nova. E há outras importantes para meses remoendo: um coração despedaçado, uma doença grave.

Há coisas totalmente absurdas: um acidente de avião, uma guerra, um ecologista morto por uma empresa de celulose, um pacifista morto por um míssil.

Quem lê os jornais está acostumado a uma dieta de más notícias. Alimentar-se de excrementos passa a ser tão normal como escovar os dentes. Chega uma hora em que nada nos comove, nada nos assombra. Estamos imunizados às desgraças mundiais. Como os jornais se amancebam com as tragédias, não faz mal imaginarmos para 2007 algumas notícias jamais proclamadas, mas possíveis:

- Nenhuma morte no Iraque no dia de ontem.

- Nenhum homicídio em Passo Fundo no final de semana.

- Nenhuma criança está trabalhando ou foi violentada na última semana.

- O presidente cumpriu as promessas de campanha.

- Comprovado: nenhum funcionário público ou policial está envolvido naquilo que devia combater.

- Todos os homens e mulheres são livres.

- Em nenhuma parte do mundo há indigência ou pobreza.

- Ninguém discrimina ninguém por sexo, cor, raça, ou qualquer diferença.

- O bem estar humano é mais importante que o dinheiro ou o poder.
Se há um conselho a ser dado é: abusemos do champanha, incentivemos o consumo da carne suína, comamos uma bacia de lentilha, cem grãos de uva por cada mês de 2007. Sem um grande esforço, continuaremos idiotas sem consistência.

Se não levarmos os sonhos a sério, os desejos de ano novo podem ser expelidos, por vômito ou diarréia, já na tarde do dia primeiro. Para mudar o mundo, não basta ser otimista.

Há alguma coisa que devíamos fazer na virada do ano e que não andamos fazendo. Temos até o último dia de 2007 para descobrirmos. Feliz Ano Novo!

Sobre o Autor

Pablo Morenno: Pablo Morenno nasceu em 21.05.1969, em Belmonte, SC, e mora em Passo Fundo, RS. É licenciado em Filosofia e bacharel em Direito. Também é professor de Espanhol em cursinhos pré-vestibular, músico e servidor público federal do Tribunal Regional do Trabalho/4ª Região, e pinta nas horas vagas. Escreve uma coluna semanal de crônicas no jornal O Nacional, de Passo Fundo RS, e Nossa Cidade de Marau-RS. Colabora com os jornais Zero Hora, Direito e Avesso, e com sites de leitura e literatura. É Membro da Academia Passofundense de Letras, ocupando a cadeira cujo patrono é Érico Veríssimo. Como animador cultural e escritor, participa de projetos de leitura do IEL- Instituto Estadual do Livro do RS e de eventos literários no Rio grande do Sul e Santa Catarina. Com suas palestras interdisciplinares e descontraídas, utilizando-se de histórias e da música, conversa com crianças, jovens, pais, professores e idosos sobre a importância da leitura e da arte na vida.

Livros publicados: POR QUE OS HOMENS NÃO VOAM? Crônicas, WS Editor e MENINO ESQUISITO, Poesia Infantil, WS Editor. Contato com o Autor: Pablo Morenno

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